Regulamentação das apostas: quais os desafios enfrentados no Brasil e no mundo?

Veja como são as leis sobre apostas em outros países e as consequências da falta de regras.

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Desafios da regulamentação das apostas online no Brasil
Cassinos e apostas online são muito populares nos EUA. (Imagem: Las Vegas - Wallpaper Cave / mani_stan)

A regulamentação das apostas online no Brasil está entrando na fase final. O governo e o setor tentam combater os efeitos nocivos dos jogos, sem atrair mais usuários para sites ilegais.

Essa questão, é também a preocupação de vários países e requer um equilíbrio delicado e desafiador. De acordo com advogados especializados, a busca por esse limiar é complexa e as experiências internacionais oferecem lições valiosas.

Impostos para as apostas online e tratamento da ludopatia

Nos países europeus, onde a regulação é mais restritiva, o mercado de apostas online legal enfrenta dificuldades. Pois a alta carga tributária afasta jogadores dos sites regulados, que buscam opções em portais irregulares. 

Mas nos Estados Unidos, a situação é diferente. A promoção das apostas online se dá de forma intensa, no entanto, há relatos sobre jovens endividados que preocupam as autoridades.

No Brasil, as regras para o setor foram definidas em uma lei aprovada em dezembro do ano passado (LEI Nº 14.790), com portarias do Ministério da Fazenda lançadas nos últimos meses. No entanto, as opiniões sobre a eficácia dessas diretrizes estão divididas. 

Especialistas do Programa Ambulatorial do Jogo Patológico (PRO-AMJO), da USP, afirmam que as restrições de publicidade e horários de jogo são insuficientes. De acordo com eles, elas são muito brandas se comparadas às normas europeias.

Críticas também surgem em relação à falta de investimentos em saúde. A nova legislação estabelece que, a partir de 2025, as casas de apostas pagarão 12,5% de imposto sobre os lucros.

Desse percentual, 2,5% serão destinados ao tratamento da ludopatia, o vício em apostas. No entanto, associações de jogos alertam que a alta taxação pode afastar empresas sérias, favorecendo a ilegalidade.

Leonardo Benites, diretor de comunicação da ANJL (Associação Nacional de Jogos e Loterias), enfatiza que o exemplo dos Estados Unidos mostra que um mercado paralelo reduzido é possível com fiscalização adequada e regime de licenciamento flexível.

Diferenças nas legislações de apostas

Um estudo do departamento de economia da Universidade de Leipzig revela que 50,9% das apostas na Alemanha vão para sites irregulares. Nos Estados Unidos, as leis sobre apostas variam entre os estados, permitindo operações em 38 deles e no Distrito de Columbia. 

Por outro lado, a União Europeia possui um conjunto básico de regras, mas cada país do bloco pode adaptar suas normas como achar melhor. Assim, no que diz respeito à publicidade e o rigor as leis acabam variando bastante. 

Enquanto a Moldávia proíbe a publicidade de casas de apostas, países como Alemanha e Portugal limitam anúncios em determinados horários. O Brasil, por sua vez, impõe responsabilidade jurídica às casas de apostas em relação à conformidade com as regras de publicidade.

A taxa de retorno ao jogador e suas implicações

Outra preocupação trazida pela nova regulamentação das apostas no Brasil é a imposição de uma taxa mínima de retorno ao jogador, o RTP (return to player). O governo determinou que este índice deve ser, no mínimo, de 85%. Ou seja, para cada R$ 100 apostados, R$ 85 deverão retornar ao apostador em um longo período de jogo.

Entretanto, a natureza aleatória das apostas online significa que muitos jogadores podem ter experiências muito distintas em relação a essa média.

Então, a falta de um controle do RTP em sites ilegais pode levar apostadores a perder mais do que em plataformas reguladas, tornando essa questão ainda mais crítica.

Apostas online. (Imagem: Freepik)

Medidas contra lavagem de dinheiro das apostas online

A nova legislação brasileira também incorpora medidas para evitar a lavagem de dinheiro. Assim, as casas de apostas devem ter um quadro societário com reputação ilibada e implementar estratégias para monitorar transações suspeitas.

Todas as apostas superiores a R$ 10 mil precisam ser reportadas ao Coaf, o Conselho de Controle de Atividades Financeiras.

Gustavo Badaró, professor de direito da USP, destaca que o monitoramento financeiro é uma prática comum em diversos países. Atualmente, 215 nações estão associadas ao Gafi (Grupo de Ação Financeira Internacional), que coordena as ações de combate à lavagem de dinheiro globalmente.

Medidas contra o jogo compulsivo

A legislação brasileira também busca combater o jogo compulsivo através de um controle mais rigoroso das transações. Dessa forma, cada aposta será vinculada ao CPF do jogador, facilitando a identificação de padrões de comportamento problemático. 

Mas, apesar das recomendações de limitar o horário das apostas online, essa proposta ainda não está contemplada nas novas regras. 

A resistência do mercado a essas limitações se deve ao perfil dos apostadores, que, em sua maioria, preferem jogar à noite. Um executivo do setor confirma que o horário das 22h às 2h geralmente é o mais movimentado, considerado até horário nobre.

Mercado brasileiro pós regulamentação das apostas

As regras sobre a regulamentação das apostas online no Brasil marcam um passo importante na tentativa de formalizar e controlar um mercado que há muito opera à margem da lei. No entanto, o sucesso depende de uma combinação eficaz de fiscalização, transparência e medidas de proteção ao consumidor.

Especialistas alertam que o sucesso dessa nova legislação dependerá, em grande parte, de como as autoridades brasileiras implementarão e supervisionarão essas novas regras.

Além disso, a adaptação do mercado, em especial no que diz respeito ao cumprimento das normas e à transparência, será crucial. A capacidade de atrair operadores legítimos e minimizar a atração por plataformas não autorizadas ficará diretamente relacionada à eficácia das medidas de controle e à confiança do consumidor.

Por fim, a experiência de outros países pode fornecer insights valiosos. O Brasil deverá observar e, se necessário, ajustar suas políticas com base nas lições aprendidas com mercados mais maduros, como os dos países europeus.