A jurista, antiga diplomata e política portuguesa Ana Gomes, em entrevista publicada no último domingo (8), analisou (entre outros assuntos) as apostas esportivas em Portugal e foi enfática e polêmica ao falar que “a criminalidade organizada nas apostas online é apenas a ponta do icebergue” para outros problemas.
Em uma longa entrevista, a membro da Comissão Nacional e da Comissão Política do PS (Partido Socialista) e mulher que já ocupou o sexto lugar na lista dos políticos portugueses mais influentes na rede social Twitter diz ainda não ter dúvidas de que haverá muita criminalidade organizada, que as apostas online, sobretudo no campeonato de futebol da 2ª divisão, escondem máfias.
Ana vai além e cita que o Benfica tem que ser investigado porque possui uma lista de 46 juízes, e que muitos negócios do seu presidente Luís Filipe Vieira deixaram um rasto de dívidas que têm que chegar aos tribunais.
Sobre Rui Pinto (hacker e denunciante português, criador do Football Leaks) e autor das revelações do caso Luanda Leaks, é muito clara: “Fez um extraordinário serviço público ao desvendar toda a criminalidade organizada que vai aí, e que não é só nos campos de futebol”.
Operação “Fora de Jogo”: Portugal está atuando por pressão externa
“Esta operação (de buscas a clubes de futebol, casas de dirigentes e de agentes desportivos) é induzida pelas autoridades de outros países que fizeram o que tinha que fazer quando saíram os Football Leaks. Os outros países fizeram seu trabalho e o nosso aparentemente não fez.”
“Tenho a percepção de que tudo o que tem sido noticiado é apenas a ponta do iceberg. Não tenho dúvidas de que haverá muita criminalidade organizada, máfias”.
Apostas online escondem criminalidade organizada
“Há uma área em que ainda nem se começou a puxar pela ponta e que é a que está ligada às apostas online. Não é por acaso que em Portugal, os jogos da 2ª divisão, a que ninguém liga propriamente muito – tanto quanto eu sei e não sei nada de futebol – são dos jogos que mais apostas online de todo o mundo concitam. É altamente indiciador de que há aí criminalidade organizada, e a nível global”.
Por que o Benfica tem uma lista de 46 juízes?
“Alguém que faça uma lista das empresas que esse senhor (Luís Filipe Vieira, presidente do Benfica) foi juntando cadáveres e quem é que tomou conta dessas insolvências? E que dívidas é que isso implicou aos bancos, dívidas em muitos casos restruturadas, isto é, perdoadas à conta de todos nós cidadãos que contribuímos para limpar os bancos e para os bancos poderem limpar os seus ativos negativos? O que eu vejo são prescrições. Sim, anunciam-se investigações, mas depois há prescrições. O polvo da corrupção que hoje está mais do que demonstrado que está por todo o lado”.
“Aquela história da lista dos juízes, com moradas, que o Benfica tinha, são 46 afinal, estive a verificar. Independentemente de eles terem ou não aceitado os convites, essa lista existia. Porque é que o Benfica a tinha? É preciso investigar”.
Objetivo da prisão preventiva é silenciar Rui Pinto
“A prisão preventiva de Rui Pinto é um absurdo. O que mais me preocupa é que esta prisão não serviu para as autoridades irem pedir a colaboração do Rui Pinto, por exemplo, para ir explorar todas as outras informações que sabemos que estão nos mais de dez suportes que não foram decifrados que só podem ser com a colaboração dele. O objetivo desta prisão é fechar Rui Pinto, assim, silenciar Rui Pinto. Eu quero que ele vá a julgamento. Acho que é uma grande oportunidade para se saber muita coisa que ele sabe”.
Acusado de 90 crimes como acesso ilegítimo, violação de correspondência, sabotagem informática e tentativa de extorsão, o português de 31 anos está por trás da punição imposta ao poderoso Manchester City, pela UEFA.
O que é o Football Leaks
O Football Leaks foi criado em 2015 por Rui Pinto, que então utilizava o pseudônimo “John”, na esteira dos escândalos que derrubaram os cartolas da Fifa. Na home de um site mal-acabado, lia-se o objetivo do projeto: “expor fundos, comissões, negociatas, e assim, tudo que serve para enriquecer certos parasitas que se aproveitam do futebol.”
Ao longo de quatro anos, o hacker lusitano teve assim, acesso a cerca de 70 milhões de documentos, que deram origem a mais de 1.000 matérias produzidas pelo consórcio de veículos de comunicação European Investigative Collaborations (EIC), liderado pela revista alemã Spiegel.
Foram e-mails vazados por Rui Pinto que mostraram como o Manchester City tentou driblar o fair play financeiro, mecanismo criado pela UEFA para manter a “saúde financeira” do futebol.
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